4.9.14

Cuidado com o que desejas
















Em Stalker, um lugar misterioso chamado «Zona» faz com que os desejos de cada pessoa se concretizem, mesmo que isso seja afinal destrutivo; em Solaris, o planeta homónimo aproveita-se das memórias dos humanos que dele se aproximem e faz com que as memórias de cada um ganhem vida, gerando mesmo «réplicas» humanóides de gente que os humanos outrora conheceram. Com Stalker aprendi a diferença entre o que queremos e o que precisamos. E com Solaris soube que nunca nos libertamos das imagens do passado. No princípio de Solaris, Kris Kelvin [o actor lituano Donatas Banionis, que morreu esta semana] queima uma série de mementos e de recordações. Mas quando é enviado para a órbita do planeta Solaris, «encontra» a sua mulher, que já morreu, e o pai, que ficou na Terra. É preciso ter cuidado com o que queremos, e cuidado com o que lembramos, porque o desejo e a memória têm maneiras de acontecer, ainda que maneiras artificiais, questionáveis, catastróficas. Achava que não me tinha esquecido disto, mas esqueci-me durante uns tempos, até que recentemente voltei a essas órbitas nocivas. Na impossibilidade de acabar com recordações e desejos, ao menos que se evite frequentar órbitas perigosas e outras Zonas, entidades que conhecem bem a nossa cabeça e nos oferecem a crueldade do falso conforto.