3.2.14

Paixão dos fracos

Penso no conceito de «a paixão dos fortes», título dado em português a um John Ford. É um bom título, mas um oxímoro inultrapassável. Os fortes conquistam, dominam, ganham aquilo a que se arrogam, os fortes são fortes porque usam a força. Enquanto os fracos julgam que a fraqueza é uma força, isto é, que a paixão faz das fraquezas forças, ou que predispõe alguém a amar as fraquezas de terceiros. Mas uma debilidade é uma debilidade, um defeito é um defeito, e assim sucessivamente, insuficiências, incapacidades, fragilidades, até já não se estar a falar de uma pessoa mas de um destroço. A paixão dos fracos é a sinceridade, mas a sinceridade é apenas uma imprudente transparência com a qual as pessoas se mostram na sua nulidade. Os fortes desprezam os fracos porque desprezam a nulidade, incluindo a sua, e todas as etapas que a ela levam, da sinceridade à transparência. Os fortes, ainda agora os ouço, confessam uns aos outros, com jactância e grosseria, vitórias anunciadas, iminentes, vítimas rendidas, que lhes virão comer à palma da mão. Muitas vezes me disseram com o seu sarcasmo nobiliárquico: «a paixão é uma coisa para os fracos». Tinham razão.