Deste mundo
Como a todos os homens, mas aqui acentuado por um espírito possesso da vertigem sem remédio das decisões trágicas, era-lhe oferecida num lado a sedução do mundo sob a forma de um rosto de mulher, incurável e magnífica fascinação do homem; no outro não lhe era oferecida coisa alguma a não ser a forma invisível de um futuro que a sua própria decisão ajudaria a sair do nada onde repousa todo o gesto humano. Kierkegaard carregou-o com a sua melancolia e a balança tombou no futuro com a figura do Kierkegaard que pôde interessar o mundo dos que, de uma forma ou de outra, literalmente falando, «não são deste mundo».
[Eduardo Lourenço, Heterodoxia II, 1967]
[Eduardo Lourenço, Heterodoxia II, 1967]